Tuesday, July 17, 2007

De volta a casa!

Fui buscar-te. Estavas sentado, já sem os pijamas do costume, com tudo arrumado, à minha espera.
Não tinhas documentos, nem chaves, nem carro. Já tinhas os óculos, a carteira, o telemóvel, as coisas que anteriormente te tinham pedido para colocares no saco para me ser entregue antes de entrares no bloco operatório. Nessa altura, sentiste-te um indigente, disseste. Mas disseste-o já tinhas sido operado... cá para mim era receio à mistura! Estás habituado à doença, mas desta vez eras tu! Devo dizer-te que eles até foram cuidadosos, colocaram os sapatos num saco e o resto num outro!
Regressaste a casa.
Nesse dia, pareceu-me que estavas um pouco febril, e... fingindo-me enfermeira, fui buscar o termómetro. No caminho, encontrei vernizes que não via há algum tempo e resolvi mudar o que tinha colocado. Demorei! Estas coisas demoram sempre!
Quando voltei para junto de ti, é que me lembrei novamente do teu estado de convalescente. E rimo-nos quando me disseste que, assim, e por ter abandonado o doente na primeira tarefa, seria expulsa do serviço.
Vá lá, não tinhas febre!

Friday, July 13, 2007

"Pai"

Agora já sabes o que é um hospital!
Agora já sabes o que custa estar lá... os dias irremediavelmente iguais, com os mesmos ruídos, os mesmos horários... as mesmas coisas.
Tu não te queixas, até brincas com o assunto... achas que vais emagrecer, com o soro e a dieta líquida, pensas mesmo que será o que vais aconselhar aos teus doentes que desejem fazer uma dietazita...
Sorriste quando o enfremeiro da triagem das prioridades disse que tinha prazer em te conhecer, porque só te conhecia de nome há muito tempo...
Agora já conheces a Sónia Araújo (não me lembro de ti a ver televisão de manhã), já sabes quem é a miúda que faz de Floribela... já sabes tantas outras coisas que o trabalho não te deixava aprender.
Já sabes quão difícil é estar no hospital, quão difícil é o trabalho de enfermeiros e auxiliares (esse eu sei que tu sabias e que valorizas), que querem que o teu vizinho de enfermaria coma e ele berra e diz asneiras, e que incansavelmente listam uma série de coisas para substituir a refeição que ele teima em não aceitar, já sabes quão agradável é receber visitas...
... porque vi que àquela hora, três em ponto, tu não tiravas os olhos da porta, porque era a única coisa de que estavas à espera!

Wednesday, July 04, 2007

Encosta-te a mim...

rendidíssima. toma conta de ti.

Colégio

Lembro-me quando entrei no colégio pela primeira vez. Era tudo tão espantosamente grande e limpo e brilhante... era tanta gente nova igual a mim, vestidas de bata aos quadradinhos pretos e brancos, camisa branca e cinto vermelho para contrastar... umas choravam, que tinham saudades da família... eu às vezes também, mas não era por nada em especial, mas por tudo, por estar longe, por não poder falar, por ter saudades também, por ter a cabeça cheia de futuro e de expectativas.
O meu mundo passou a ser outro, os meus amigos cá fora foram crescendo como eu, mas à distância... cada um à sua maneira e bem diferente, as estações seguiam-se umas às outras, a chuva vinha, vinha o sol, o calor, mas o tempo, esse... era interminavelmente difícil de passar. Cheguei a ficar lá períodos inteirinhos, cheguei a sonhar que ouvia alguém chamar-me e acordava, mas rapidamente me apercebia que não passava de um sonho. Vi colegas a desistir, mas eu sempre achei que não o faria.
Trinta e tal anos depois, do alto da minha meia idade, vejo hoje, mais do que nunca, que ter lá estado me deu uma enorme capacidade de me adaptar a tudo na vida.